Hoje, ao acordar de manhã, prestei atenção - melhor dizendo, peguei meio en passant a declaração de uma repórter da rádio Eldorado AM - não me recordo seu nome agora - no informativo Leitura de Domingo falando que "hoje a cultura geral está 'demodé'. Me intrigou assaz tal afirmação, especialmente porque vinda de uma radialista, profissional de comunicação, que, por princípio, deve possuir um grande embasamento de cultura geral...fiquei espantado em ouvir tal nonsense...
Venho talvez da última geração que foi educada dentro desse patamar, de que a cultura geral é o grande passaporte para o enriquecimento pessoal, no aspecto da construção do senso crítico e de uma visão mais equânime das coisas...Lembro-me de meus tempos de escola, em que fazíamos parte dos "clubes de conhecimento"; havia o Clube de Álgebra,o Clube de Astronomia,o Clube de Ciências, o Clube de Literatura e tantos outros igualmente existentes. Mas não se pense que eram clubes excusivistas;para se ter uma idéia, em minha época, o melhor colocado no Clube de Literatura - escrevia poesias belíssimas - era igualmente insígne membro dos clubes de Álgebra e de Astronomia...Lembro das disciplinas de Programas de Saúde, Educação Musical (maravilhosa Profa. Matilde, que me fez despertar o amor pelos clássicos, me ensinado as diferenças tonais e a "assinatura" de cada compositor)e mesmo a disciplina de Educação Moral e Cívica, onde, mesmo tendo consciência de aquilo não passava da cantilena constante do governo, mas ao menos tínhamos noção de nossa importância enquanto cidadãos. Éramos preparados para a vida em sua mais verdadeira isntância...Tive minhas primeiras grandes noções de cultura geral não das mãos de mestres-escola ou mesmo de professoras, mas das mãos de um médico, ou melhor de dois médicos, de saudosa memória, do tempo em que ser médico era ser um pilar de pensamento e conduta, não os meros "passadores de receita" que vejo hoje...Dr. Orlando e Dr. Amazonas, pediatra e clínico geral, respectivamente, que cuidaram de três gerações da família, e cujas conversas, a cada tempo, mais e mais me enriqueciam...Mas tal exercício não era privilégio daqueles que estudaram em escolas particulares; minha mãe e minhas tias, egressas de escolas públicas, tinham até muito mais erudição que eu; com minha mãe tive minhas primeiras aulas de alfabetização e as primiras noções de francês - primeira língua que aprendi - me foram dadas por elas...
Hoje, a busca por "especialização", produz cada vez mais mentes estreitas, que não sabem exercer a prática do conhecimento nem mesmo dentro de sua própria área. As instituições de ensino - do fundamental ao superior, traem a alma mater da educação, que é preparar o indivíduo para a construção de sua personalidade e de sua vida. Antes, fazem apenas prepará-lo para ser um profissional, um autômato bitolado que não pratica a princpal razão de ser da educação - a participatividade no processo social...
Sou docente - na área de idiomas - e vi a que ponto chegam as aberrações a que esse processo de bitolamento conduz; muitos alunos queriam aprender um inglês "especializado" - negócios,comércio e finanças, na maior parte das vezes - e queriam limite de tempo para isso; minha resposta era seca e curta; "como queres aprender o especializado se nem do básico tens noção?" Mas o marketing dos "milagres de aprendizado", vende seu peixe para os incautos. Vejo em anúncios espalhados pela cidade as "faculdades relâmpago", prometendo formar profissionais no mais curto espaço de tempo, sem imaginar que ela formará não pessoas capazes de produzir ciência, mas apenas repetidores, sem capacidade para construir ou mesmo trabalhar seu objeto de conhecimento; ou seja, formará profissionais, mas não cientistas, pesquisadores ou mesmo pensadores; o diploma é apenas um "passaporte de elevação de nível", que nenhuma importância terá na construção da personalidade; ele vira apenas mais uma ferramenta. A Universidade, ao invés de construir o futuro intelectual, constrói apenas engrenagens que não saberão sequer pensar...
Mas não me imaginem um inimigo da modernidade; a informática deu agilidade a um processo que era mais lento, em salas de leitura ou bibliotecas - e eu bem sei disso, pois faço parte da chamada "geração de transição" dos livros para os computadores - mas mesmo essa modernidade vem sendo mal usada, pois, ao invés de construir indivíduos centrados, cônscios de seu senso crítico e de sua participatividade, são meros autômatos sem a menor capacidade de se fazer sentir em uma sociedade tão carente de inovações...
Por isso, me valho da frase do inesquecível Carlos Lacerda, respondendo a um jornalista que perguntou a ele se tanto conhecimento não o enfastiava ou incomodava, e se ele preferia saber menos, a resposta foi centrada e lapidar: "Eu prefiro saber menos de muito mais do que mais de muito menos"
Deus abençoe a todos!!!
domingo, 14 de junho de 2009
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Não é possível que a repórter estivesse falando sério! Ela devia (rogo!) estar sendo irônica... :o)
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