quinta-feira, 1 de maio de 2014

Crônicas da Casa Alta 7 - Tempos de Aprendizado

Falei de tempos, de gostos, de sons, eu sempre atento a registrar tudo, memórias que são mais que isso: são o revelar de uma alma que sempre foi curiosa, inquieta e intensa em todas as suas coisas, que gostava de buscar tudo em todas as coisas que lhe caíam nas mãos. Era meu começo de aprendizado...Falemos então, dessas memórias... Minha mãe, sendo professora, alfabetizou-me em casa; ela viu o meu interesse pelos livros e logo passou a me introduzir às cartilhas e abecedários, com especial atenção para a caligrafia; minha mãe sempre teve - e ainda tem - uma caligrafia esmerada, aprendida com um amanuense que era amigo da família; assim ela passou igualmente esse conhecimento a mim, de modo que muita gente acha a minha maneira de escrever um tanto rebuscada, dizem alguns, mas tudo bem... Meu primeiro livro foi um livro de Julio Verne, chamado "Miguel Strogoff, o Correio do Czar", que falava das aventuras de um correio especial a serviço do czar, que recebe uma missão especial para tentar deter a rebelião que ameaçava destronar o monarca russo; li-o com tanta avidez - até demais para um menino de quatro anos - que eu pegava a lanterna e lia o livro debaixo da coberta da cama pra não acordar ninguém com a luminosidade. A paixão pela leitura - e igualmente por Julio Verne - não parou mais... Mas era chegado o tempo de enfrentar a prova de seleção para as escolas, e minha mãe optou pelo Marista, escola muito tradicional na cidade, famosa por ser a que mais tinha alunos bem colocados em faculdades e universidades Brasil afora - na minha cidade só havia a Universidade Federal - UFMA e a estadual - UEMA. Feita a escolha, no dia da prova de seleção fui, compenetrado, pra sala de testes, recebi a folha mimeografada com as questões - a prova ainda estava cheirando a álcool - e me entreguei ao teste. Somente dois dias depois é que minha mãe recebeu a notícia de que eu tinha sido aprovado e, pelas minhas notas - fui o segundo melhor colocado - tinha ganho o direito à bolsa. Começava aí minha história com o Colégio Marista
Meu primeiro dia foi de susto - eu era o menor da minha turma - mas essa impressão foi logo desfeita pelas primeiras amizades que fiz - Cláudio e Luiza, dois gêmeos que foram os meus primeiros amigos; depois os outros foram pouco a pouco se aproximando: César, o maior da turma, que era uma pessoa de coração de ouro; Antonio Pecegueiro, que já desde esse tempo era uma pessoa observadora e cheia de ideias para o futuro; Rogério e Lenka, dois irmãos que eram muitíssimo inteligentes e que se tornaram meus grandes companheiros de conversa. Assim se passaram os meus primeiros dias... Um lugar logo me tomou de assalto: a biblioteca da escola, uma das mais bem equipadas da cidade, rivalizando mesmo com a Biblioteca Pública do Estado, nela passava as minhas horas livres e alguns recreios, mas não pensem que eu era somente rato de biblioteca: sempre tempo tinha para as brincadeiras, embora o sempre atento irmão Jorge procurava impor um certo limite. Tenho ainda fortes lembranças dele, sempre andando pelos corredores, pra ver se os alunos se portavam, mesmo na saída para o recreio... Outra lembrança forte era a da cantina, onde seu Elias, um simpático libanês de sobrancelhas de taturana e espírito bonachão, tentava organizar a fila, ajudado na maior parte das vezes pela esposa, dona Vilma e pela filha Jacqueline , que idem estudava lá. Em todo o meu tempo de escola, jamais os vi sequer ter uma discussão; era uma família unida As professoras eram todas muito dedicadas e diligentes, mas três foram marcantes: Profa. Paula, minha primeira professora; Profa. Margarida, que ajudou , acima de tudo, a aprimorar meu interesse pela leitura e me fez ficar mais encantado ainda pelo francês, que eu aprendera na infância; e, finalmente, A Profa. Isabel, de Ed. Musical, que me abriu as portas de um novo e maravilhoso mundo, o da música erudita - eu já conhecida o jazz por causa de meu avô - e simplesmente me embeveceu os sonhos... A vida escolar me abriu os horizontes e me deu mais confiança pra muitas coisas, especialmente para reparar melhor o mundo que me cercava, a ponto de arriscar muitas coisas novas; um dia, minha mãe demorou muito a me buscar por causa de um problema no escritório,e, quando me dei conta de que passava do horário, assumi o risco de voltar pra casa sozinho; falei isso para a inspetora com tanta convicção que ela me deixou ir; quando eu cheguei em casa sem minha mãe, Maria do Carmo e minha avó tiveram um susto tal que ainda hoje lembro da expressão delas, embasbacadas com o meu feito; eu havia decorado todo o caminho da escola pra casa...

Nenhum comentário:

Postar um comentário

A honra e o privilégio são meus...Muitíssimo Obrigado!!!